Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), uma organização da sociedade civil, revela que a economia moçambicana já estava em “progressivo abrandamento rumo à recessão”, quando a pandemia da Covid-19 atingiu o nosso país, pelo que a doença de origem chinesa não pode ser apontada como a “causa primária” da crise económica do país.
A pesquisa, cujos resultados foram publicados no livro “Desafios para Moçambique 2021”, resulta da narrativa apresentada pelas instituições da Bretton Woods (Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional – FMI), segundo a qual, a crise económica mundial de 2020 resultou exclusivamente da pandemia da Covid-19. Aliás, a narrativa é também secundada pelo Governo moçambicano, em todas as suas intervenções.
Entretanto, no caso de Moçambique, a pesquisa realizada pelo IESE contraria essa tese. Defende que, apesar da economia moçambicana ter experimentado uma taxa de crescimento do PIB negativa de -1,3%, em 2020, o facto não se deve ao grau de propagação da pandemia no país, mas “à combinação simultânea dos efeitos das medidas restritivas dos seus principais parceiros económicos, das medidas tomadas internamente, bem como da conjuntura económica em que se encontrava à chegada da pandemia”.
Refere, por exemplo, que até 29 de Agosto de 2021, o país contava com um total cumulativo de 75.828 casos positivos do novo coronavírus, para uma população estimada de 30.832.244 de habitantes em 2021, o que representava 0,25% da população cumulativa infectada, num universo de 1,9% da população de testados.
Segundo o IESE, a Covid-19 eclodiu num momento em que a economia moçambicana se encontrava em “paulatino arrefecimento e relativamente fragilizada”, pois, as taxas de crescimento do PIB vinham reduzindo nos anos anteriores, registando-se 3,4%, em 2018, e 2,3%, em 2019, respectivamente.
A pesquisa explica ainda que o Investimento Directo Estrangeiro (IDE) já estava numa tendência descendente desde 2012, ano do seu pico. Em 2012, houve um registo histórico de 6.550,8 milhões de USD em IDE, porém, em 2017, por exemplo, foram registados 2.293,6 milhões de USD e, em 2019, 2.211,7 milhões de USD. Já, em 2020, foram registados 2.337,0 milhões de USD.
O IESE realça ainda que a economia moçambicana é altamente vulnerável aos choques externos, facto que deriva de vários factores, incluindo a elevada dependência de influxos de capital externo (quer por via da dívida pública externa para financiar os gastos do Governo na prossecução de políticas públicas, quer por vias do IDE, que financia a produção).
A queda no valor das exportações de bens, na Balança Comercial, causada pela queda dos preços das commodities no mercado internacional, que teve o seu início em 2018 e o seu ponto mais baixo em 2020, também é apontada como estando na origem da situação calamitosa da economia moçambicana. A pesquisa explica que a indústria extractiva também já havia registado um declínio significativo nas suas exportações, dando exemplo das exportações do carvão mineral, que caíram de 71%, em 2018, para 66%, em 2019, e 57%, em 2020.
Michael Godet Sambo, autor do estudo, não esquece as dívidas ocultas, que precipitaram a retirada do apoio directo ao Orçamento Geral do Estado por parte dos parceiros económicos bilaterais e multilaterais, na sequência da descoberta de empréstimos ilegais, no valor de 2.2 mil milhões de USD. Por estas razões, o estudo defende que a Covid-19 foi um factor impulsionador da crise e não necessariamente o causador.
Refira-se que o artigo resultou da análise bibliográfica e documental, com ênfase para a análise de dados estatísticos de múltiplas fontes internacionais e nacionais, destacando as fontes oficiais, e analisou as dinâmicas económicas no contexto da COVID-19, com enfoque nas relações económicas de Moçambique com o resto do Mundo desde antes da eclosão da pandemia até aos princípios de 2021.
Fonte: Cartamz