O Tribunal Superior de Gauteng, em Joanesburgo, pronunciou-se esta quarta-feira (10.11) sobre a contestação da sociedade civil à extradição do ex-ministro das Finanças Manuel Chang para Moçambique, tendo decidido invalidar a decisão do ministro sul-africano da Justiça Ronald Lamola, de extraditar Chang para o seu país de origem e ordenando o seu envio para os Estados Unidos da América.
Após a leitura da sentença, de 75 páginas, por videoconferência, a juíza Margarete Victor concluiu que a decisão do ministro Lamola "é inválida".
"Em resultado, ordeno, em primeiro lugar, que a decisão do segundo respondente [ministro da Justiça] em 23 de agosto de 2021 para extraditar o primeiro respondente [Manuel Chang] para a República de Moçambique é declarada inconsistente com a Constituição da República da África do Sul, de 1996, e é inválida e nula", declarou.
"Em segundo lugar, a decisão do segundo respondente [ministro da Justiça] em 21 maio de 2019 é substituída pelo seguinte: o Sr. Manuel Chang deve ser entregue e extraditado para os Estados Unidos da América para ser julgado pelos seus supostos crimes, nos Estados Unidos da América, tal como está contido no pedido de extradição de 28 janeiro de 2019", concluiu a juíza sul-africana.
O Ministério da Justiça sul-africano e o advogado de Manuel Chang afirmaram que vão comentar a decisão depois de verem a sentença por escrito.
Resposta à sociedade civil
Tanto Moçambique como os EUA tinham solicitado a extradição do antigo titular das Finanças no âmbito do seu alegado papel no escândalo das dívidas ocultas de 2 mil milhões de euros. Chang, que se encontra detido na África do Sul desde 2018, nega a prática de actos ilícitos.
Em agosto e após um longo atraso, o ministro da Justiça da África do Sul, Ronald Lamola, decidiu enviar Chang para Moçambique, mas a decisão foi contestada em tribunal por grupos da sociedade civil, entre eles o Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO), que argumentam que o ex-ministro só seria julgado de forma adequada nos Estados Unidos.
A decisão do Tribunal Superior de Gauteng proferida esta quarta-feira responde à contestação do FMO à extradição de Manuel Chang para o seu país. O FMO, organização que tem defendido a extradição de Manuel Chang para os EUA desde a sua detenção na África do Sul, submeteu a 3 de agosto uma ação urgente à Justiça sul-africana a solicitar a revisão da decisão do ministro da Justiça sul-africano Ronald Lamola.
Juíza questiona imunidade em Moçambique
Na ótica da juíza Margarete Victor, "a corrupção contribui para os países pobres ficarem ainda mais pobres", salientando que o ministro da Justiça sul-africano deveria ter justificado na sua "plenitude" os motivos da decisão de extraditar o ex-ministro das Finanças Manuel Chang para Moçambique.
"Há considerações materiais que colocam em causa, por exemplo, o mandado de prisão", sublinhou a juíza, referindo-se a um segundo mandado de prisão emitido a 14 de fevereiro de 2020 pelas autoridades de Moçambique contra Manuel Chang, que considerou de "difícil entendimento".
"Parece que existe um crime de corrupção passiva para um determinado ato e não está claro se haverá punição do Sr. Chang nesse sentido", frisou.
A juíza questionou ainda o estatuto atual de imunidade de acusação que Chang alegadamente beneficia no seu país. "Não me parece totalmente esclarecido por Moçambique, uma vez que não existem garantias da parte do Governo de Moçambique de que o Sr. Chang será julgado pelas suas ações durante o seu mandato no Governo", considerou.
Fonte: DW